6.7.06

A culpa da televisão pelo fracasso da seleção


Coluna de Antonio Brasil no portal comunique-se

Não faltaram histórias na cobertura da Copa da Alemanha pela televisão brasileira. Faltaram fatos e verdades. Ainda em estado de choque, os brasileiros tentam entender por que o Brasil fracassou. Quem seriam os responsáveis pela derrota da melhor seleção do mundo? Mas, segundo o treinador da seleção Carlos Alberto Parreira, “não é hora de buscar os culpados. É hora enterrar o defunto”. Discordo. É hora sim de buscar o segredo da verdade, os fatos antes que eles também sejam esquecidos ou “enterrados”. Antes que eles se tornem meras “histórias”. É hora de buscar as razões do fracasso de um modelo de seleção e de um modelo de televisão.

Segundo a cobertura “excrusiva”, éramos os favoritos, os melhores do mundo e tínhamos o melhor jogador do planeta. O que aconteceu? É hora de investigar se a televisão teria ocultado a verdade e contribuído para um excesso de otimismo para garantir interesses comerciais.

Assim como a nossa seleção, a nossa televisão há muitos anos também está acomodada no passado e não se renova. Privilegia negociações secretas, interesses de patrocinadores e de políticos que garantem monopólios e contratos nebulosos de exclusividades.

Devemos exigir explicações de jogadores, técnicos e dirigentes sobre o fracasso da seleção. Mas também devemos investigar os acordos entre a CBF e a Globo que garantem não só os direitos exclusivos de transmissão de jogos mas também garantem uma cobertura jornalística de interesses mútuos com poucos fatos e muitas histórias.

Logo nos primeiros dias fomos surpreendidos com uma entrevista “excrusiva” com Ronaldinho de carro a caminho da concentração. Longe dos competidores, no “sapatinho”, jogadores veteranos e jornalistas privilegiados selavam o acordo e trocavam elogios. A cobertura de muitas histórias e poucos fatos estava só começando.

O discurso afinado de sucesso garantido era contrariado pela verdade das imagens que mostravam um Ronaldinho chegando de jatinho particular, “enorme” de gordo, totalmente desinteressado e fora de forma. A cobertura de TV preferia privilegiar as histórias, ocultar ou ignorar os fatos. A informação é obviamente dispensável ou negociável. O importante era garantir os privilégios de tantas entrevistas “excrusivas” e os lucros da grande audiência para os jogos e para os sorteios “nebulosos” da seleção do Faustão.

Na falta de fatos, a cobertura optou por histórias sem pé nem cabeça, banalidades e patriotadas em um grande festival de besteiras.

As notícias de verdade, os fatos poderiam prejudicar a audiência das transmissões exclusivas.

Nesta época, a competição televisiva é massacrada. Os dados parciais relativos ao Ibope comprovam a impressionante transformação que a Copa provoca no perfil da audiência da TV brasileira. Há destacar, no entanto, o heróico desempenho da equipe da Bandeirantes durante a Copa. Nada de muito criativo ou diferente. Mas valeu o esforço. Um pequeno Davi que enfrenta o gigante Golias. Não vence. Mas não fez feio.

De forma muito oportunista, o foco da cobertura só mudaria neste último final de semana. Ou seja, tarde demais. Após o fracasso o JN e o Fantástico resolveram buscar nas imagens os culpados pela derrota contra a França. Sobrou para o Roberto Carlos. De herói sempre bem humorado, divertido e disponível para tantas entrevistas exclusivas, virou o diabo, o “traidor” da pátria.

Agora, tarde demais, começam a aparecer denúncias que ficaram ocultas durante a cobertura de interesse. Somos surpreendidos com racha entre os jogadores, reclamações contra a comissão técnica e a teimosia do treinador. É o jornalismo de oportunismo. Antes tudo era festa. Pouco jornalismo para garantir altos índices de audiência e ainda maiores interesses comerciais.

Em clima de caça às bruxas, o Fantástico, parafraseando Jean-Paul Sartre, para parecer chique e intelectual, anuncia que o “inferno não são os outros”. São certos jogadores e treinadores. Nenhum jornalista. Para mim, o inferno é ter que aturar mais besteiras do Big Brother Bial.

Com uma cobertura de verdade única, a televisão confundiu jornalismo com patriotismo. Jornalistas acompanham a linha de narração dos jogos no estilo Galvão Bueno e, ao invés de informar, torcem e distorcem. E ainda pior, limitam e excluem qualquer competição.

É preciso repensar a Copa do Mundo na TV. Assim como exigimos a renovação da seleção, também deveríamos exigir a renovação da televisão. Não há mais lugar para uma cobertura com excesso de besteiras e pouquíssimas notícias de verdade.

É hora de aposentar Roberto Carlos, Cafu, Parreira, Zagalo, Galvão Bueno, Fátima Bernardes e tantos outros. É hora de inovar e renovar. Não há mais lugar para um modelo único e ultrapassado de televisão.

É importante investigar o que ocorreu com a nossa seleção e com a cobertura da nossa televisão. Mas “enterrar” os fatos? Jamais. É hora de pensar no futuro, nas campanhas eleitorais. Ou será que a Globo também vai garantir os direitos de exclusividade nas próximas eleições?

Um comentário:

. rafael rocha. disse...

para mim, a frase a seguir resume tudo:
.
"Com uma cobertura de verdade única, a televisão confundiu jornalismo com patriotismo. Jornalistas acompanham a linha de narração dos jogos no estilo Galvão Bueno e, ao invés de informar, torcem e distorcem. E ainda pior, limitam e excluem qualquer competição."
.
a posição dos órgãos brasileiros de imprensa na cobertura da Copa foi única: esqueceram de fazer jornalismo. jornalismo é informação, o que faltou! tivemos muito oba-oba, muita torcida, não só pelo Brasil, o que ainda é aceitável, mas contra e a favor de outras seleções, o que sou estritamente contra!
.
enfim, eu gostaria de saber, pra quem a imprensa brasileira vai torcer na final?